Minha Felicidade, de Sergei Loznitsa
existem dois tipos de pessoas que são realmente capazes de me irritar: as lerdas e as folgadas. normalmente, quando eu ando nas ruas ou em algum lugar público e me deparo com elas atrapalhando a vida alheia é absolutamente impossível não notar minha completa situação de transtorno. porém, tudo sempre pode piorar: existem as pessoas lerdas E folgadas.
na mostra, essas pessoas se personificam em um ato: aqueles seres doentios e enviados por satanás que insistem em montar sua programação na fila da central. a tragédia ocorre da seguinte forma: você, com pressa e quinze minutos para seu próximo filme começar, chega na fila e percebe que são só três pessoas à sua frente. tranquilo, dará tempo, você pensa imediatamente. porém, faltando só um ser para finalmente sua vez chegar, ocorre o episódio demoníaco: a criatura, talvez por puro sadismo, tira o catálogo da bolsa e começa ali a marcar o que pretende ou não ver. e assim vai por infinitas horas, inclusive com perguntinhas para o atendente: e aí, vejo o sol ensolaradamente solar ou a ascenção e a queda dos jacarés tailandeses? ah, se você tivesse um machado ou algo que causa uma morte dolorosa, hein?
senhores, hoje eu perdi hora, não acordei a tempo e acabei chegando no cinema para ver o documentário sobre william burroughs GÊNIO com meia hora de atraso. um absurdo pessoal. missão abortada. tive que me virar pra escolher outro filme para ocupar o espaço.
o escolhido foi o italiano o herdeiro, de michael zampino. infelizmente, é um produto sub-supercine, com alguns momentos engraçados ou de relativo interesse mas afundado em clichês e situações padrão do suspense hollywoodiano. mostremos só a sinopse: homem herda uma casa da qual nem sabia a existência de seu pai. ao chegar lá, conhece seus vizinhos estranhos e sua vida começa a desmoronar com revelações estranhas e perigo constante. pô, sessão da tarde, tem um emprego pra mim aí? só faltou um incríveis confusões.
pois bem. seria ótimo se a produção não apelasse à árvore que cai e impede a estrada de volta ou à construção totalmente absurda de personagens. com todos esses trejeitos batidos e imperdoáveis, qualquer cena engraçada ou divertida fica difícil de ser engolida.
é o contrário do que acontece no aclamadíssimo minha felicidade, de sergei loznitsa. um filme que foge de padrões, cria sua própria narrativa, seu próprio jeito de contar estórias, mas, mais que isso, fazer um mosaico que forme um painel desolador e brutal da rússia contemporânea e passada.
minha felicidade transpira violência e medo o tempo todo. qualquer pessoa presente pode ser morta por qualquer outra a qualquer momento. o plano inicial já mostra um cadáver abandonado sendo coberto por concreto. daí em diante, é o desenvolvimento de mini-contos sempre com o mesmo final, sempre com a mesma moral. a maioria deles possui um poder absoluto. o filme tem intenção de ser pesado e consegue com muita facilidade.
acaba sendo um exemplar do cinema russo de sempre - silencioso, lento, introspectivo - mas também com os dois pés no novo cinema romeno, que aliás é a nacionalidade de seu diretor de fotografia. o clima de terror, porém, perdura a projeção toda e fica ainda por um tempo.
pela temática e violência, seria um o albergue em versão road movie de arte. e deve reduzir os intercâmbios pra rússia em uns 95%, a não ser que as pessoas andem dentro de um bunker nas ruas.
ok, desculpem pelo último parágrafo de piadinhas mesmo em um filme como esse. simplesmente não posso evitá-las. foram os primeiros comentários feitos na saída do cinema, aliás.
e amanhã tem tio boonmèe!
(o herdeiro - 1.5/4, minha felicidade - 3.5/4)
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